A gravação ambiental feita pela vítima de crime

análise da continuidade de sua licitude após a Lei n. 13.964/2019

Autores

DOI:

https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i2.696

Palavras-chave:

Gravação ambiental, Pacote Anticrime, Colisão de direitos fundamentais, Princípio da proporcionalidade.

Resumo

O presente trabalho tem por objetivo analisar o alcance interpretativo do art. 8º-A, § 4º, da Lei n. 9.296/1996, introduzido pela Lei n. 13.964/2019, que estabelece que apenas poderão ser utilizadas no processo penal as gravações ambientais feitas por um dos interlocutores sem o consentimento do outro “em matéria de defesa”. Indagou-se: são lícitas as gravações ambientais realizadas por vítima de crime? Quanto à metodologia, utiliza-se do raciocínio indutivo com uso de revisão bibliográfica nacional e estrangeira e de decisões judiciais sobre o tema, especialmente dos EUA, Alemanha, Portugal, cortes europeia e interamericana de direitos humanos e do STF. Conclui-se que as gravações ambientais possuem uma tipicidade de violação dos direitos fundamentais à imagem e voz, bem como o direito ao auditório. Tal tipicidade é indicativa de ilicitude. Todavia, o princípio da proporcionalidade funciona como causa excludente da ilicitude. Assim, a situação de legítima defesa probatória pela vítima de crime pode justificar o uso de gravações clandestinas, sempre que o direito a ser protegido tiver valor superior à expectativa de privacidade e de proteção à voz e à imagem do autor de crime. Conclui-se com a necessidade de uma interpretação conforme à Constituição, para se entender o que a cláusula significa “em matéria de defesa de direitos fundamentais”.

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Biografia do Autor

  • Charles Martins, Universidade de Lisboa, Lisboa

    Doutorando em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade de Lisboa, Mestre em Direito Público pela Universidade de Santa Cruz do Sul, Professor convidado da FMP, Promotor de Justiça do MPRS.

  • Thiago Pierobom de Ávila, Centro Universitário de Brasília - Brasília/DF

    Doutor em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade de Lisboa, com estágio de pós-doutorado em Criminologia pela Monash University, Professor Associado do PPG Direito do UniCEUB, Investigador afiliado do Instituto de Direito Penal e Ciências Criminais da Universidade de Lisboa e do Gender and Family Violence Prevention Centre da Monash University, Promotor de Justiça do MPDFT.

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Publicado

26.08.2022

Edição

Seção

Teoria da Prova Penal

Como Citar

Martins, C., & Ávila, T. P. de. (2022). A gravação ambiental feita pela vítima de crime: análise da continuidade de sua licitude após a Lei n. 13.964/2019. Revista Brasileira De Direito Processual Penal, 8(2). https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i2.696