Presuntivismo e falsa contraposição entre mentira e verdade: duas possíveis causas para seguirmos ignorando o impacto de fatores como a passagem do tempo e as informações pós-evento no processo penal.
Três propostas sobre o que fazer.
DOI:
https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i3.740Palavras-chave:
Prova testemunhal, Psicologia do Testemunho., Raciocínio ProbatórioResumo
O presente estudo aborda a passagem do tempo e a informação pós-evento como dois fatores com potencial impacto na prova testemunhal que, apesar de provados cientificamente há tempos, seguem sem tratamento adequado no processo penal. O artigo pretende responder a dois questionamentos: (i) por que, diante de tantas evidências científicas, fatores como a passagem do tempo e as informações pós-evento seguem sendo ignorados pelo direito e, especificamente, pelo processo penal?; (ii) como é possível desenhar o processo penal para que esse passe a considerar e a lidar com a passagem do tempo e com as informações pós-evento? Para isso, na primeira parte, são apontadas duas razões que contribuem para manter tais problemas ocultos (presuntivismo e falsa dicotomia entre verdade e mentira); na segunda parte, são apresentados os problemas; e na terceira parte são formuladas três propostas para buscar lidar com esses (produção imediata, quando possível, e existência de protocolos quanto à forma de fazer perguntas e à necessidade de gravação. A metodologia utilizada é a revisão bibliográfica de escritos da psicologia do testemunho, da epistemologia do testemunho e da doutrina do processo penal.
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