Presuntivismo e falsa contraposição entre mentira e verdade: duas possíveis causas para seguirmos ignorando o impacto de fatores como a passagem do tempo e as informações pós-evento no processo penal.

Três propostas sobre o que fazer.

Autores

DOI:

https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i3.740

Palavras-chave:

Prova testemunhal, Psicologia do Testemunho., Raciocínio Probatório

Resumo

O presente estudo aborda a passagem do tempo e a informação pós-evento como dois fatores com potencial impacto na prova testemunhal que, apesar de provados cientificamente há tempos, seguem sem tratamento adequado no processo penal. O artigo pretende responder a dois questionamentos: (i) por que, diante de tantas evidências científicas, fatores como a passagem do tempo e as informações pós-evento seguem sendo ignorados pelo direito e, especificamente, pelo processo penal?; (ii) como é possível desenhar o processo penal para que esse passe a considerar e a lidar com a passagem do tempo e com as informações pós-evento? Para isso, na primeira parte, são apontadas duas razões que contribuem para manter tais problemas ocultos (presuntivismo e falsa dicotomia entre verdade e mentira); na segunda parte, são apresentados os problemas; e na terceira parte são formuladas três propostas para buscar lidar com esses (produção imediata, quando possível, e existência de protocolos quanto à forma de fazer perguntas e à necessidade de gravação. A metodologia utilizada é a revisão bibliográfica de escritos da psicologia do testemunho, da epistemologia do testemunho e da doutrina do processo penal.

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Biografia do Autor

  • Vitor de Paula Ramos, Universitat de Girona, Girona

    Doutor em Direito, Economia e Empresa pela Universidade de Girona (Espanha), cum laude. Mestre e Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde se graduou com láurea acadêmica. Professor do Mestrado em Raciocínio Probatório da Universidade de Girona (Espanha) e nos cursos de pós-graduação lato sensu em Processo Civil da PUCRS e da Uniritter. Coordenador da Coleção Raciocínio Probatório, publicada pela Editora JusPodivm. Professor convidado em diversos cursos de Processo Civil e Direito Probatório, no Brasil e no Exterior. Membro efetivo da IAPL (Associação Internacional de Direito Processual) e do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Processual). Membro do Conselho Assessor da Revista Internacional de Direito Probatório Quaestio Facti. Autor de livros publicados pela RT e pela Marcial Pons (Espanha), artigos publicados no Brasil e no exterior, além de traduções jurídicos. Advogado atuante.

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Publicado

29.10.2022

Edição

Seção

DOSSIÊ: Prova testemunhal no processo penal

Como Citar

de Paula Ramos, V. (2022). Presuntivismo e falsa contraposição entre mentira e verdade: duas possíveis causas para seguirmos ignorando o impacto de fatores como a passagem do tempo e as informações pós-evento no processo penal. : Três propostas sobre o que fazer. Revista Brasileira De Direito Processual Penal, 8(3). https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i3.740